Como um Trauma Pode Desencadear um Transtorno de Ansiedade: Perspectivas da Neurociência e da Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT)
- Marleide Rocha

- 21 de jul. de 2024
- 3 min de leitura

O impacto de um trauma na saúde mental pode ser profundo e duradouro, frequentemente resultando em transtornos de ansiedade. A neurociência e a Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT) oferecem abordagens complementares para que possamos entender e tratar esse fenômeno. Então nesse texto quero explorar como traumas podem desencadear a ansiedade e como a ACT, terapia comportamental baseada em princípios da aceitação e do compromisso, pode ser uma ferramenta eficaz no tratamento desse problema.
Para iniciar, precisamos compreender fisiologicamente o que acontece quando uma pessoa passa por uma experiência traumática, é importante salientar que todas as nossas experiências mentais, são também experiência corporais e compreender os mecanismos envolvidos em tais experiências é crucial para o bom prognóstico do quadro.
O Papel da Neurociência na Compreensão do Trauma e Ansiedade
A neurociência tem contribuído significativamente para nossa compreensão de como o trauma afeta o cérebro e pode levar à ansiedade. Estudos mostram que experiências traumáticas podem alterar a estrutura e a função cerebral, especialmente em áreas envolvidas na resposta ao estresse e regulação emocional:

1. Amígdala e Resposta ao Medo: A amígdala, uma estrutura cerebral central no processamento do medo, frequentemente se torna hiperativa em indivíduos que sofreram traumas. Essa hiperatividade pode resultar em uma resposta exagerada ao estresse e aumento da vigilância, características comuns nos transtornos de ansiedade. Como Bessel van der Kolk aponta, "O trauma resulta em uma recalibração do sistema de alarme do cérebro, uma alteração na filtragem do que é considerado relevante e uma reconfiguração da forma como o cérebro gerencia a percepção" (van der Kolk, 2014).
2. Hipocampo e Memória: O hipocampo, essencial para a formação de novas memórias e contextualização de eventos, também pode ser impactado pelo trauma. Reduções no volume do hipocampo têm sido associadas a transtornos de ansiedade, como o transtorno de estresse pós-traumático (TEPT). Essa alteração pode dificultar a distinção entre ameaças reais e percepções de perigo, contribuindo para uma resposta ansiosa.
3. Eixo HPA (Hipotálamo-Pituitária-Adrenal): O eixo HPA regula a liberação de hormônios do estresse, como o cortisol. Traumas podem desregular esse sistema, resultando em uma resposta ao estresse cronicamente elevada, que sustenta os sintomas de ansiedade.
A Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT) e o Tratamento da Ansiedade Pós-Trauma
A ACT oferece uma abordagem terapêutica inovadora para lidar com a ansiedade resultante de traumas. Em vez de focar na eliminação de sintomas, a ACT enfatiza a aceitação das experiências internas e o comprometimento com ações que promovam uma vida rica e significativa.

1. Aceitação: A ACT ensina os pacientes a aceitarem suas emoções e pensamentos dolorosos em vez de evitá-los ou lutar contra eles. Steven C. Hayes, um dos fundadores da ACT, explica que "A aceitação não significa gostar ou querer as emoções, mas sim fazer espaço para elas, permitindo que sigam seu curso natural sem tentar controlá-las" (Hayes et al., 1999).
2. Desfusão Cognitiva: Uma técnica central na ACT é a desfusão cognitiva, que ajuda os pacientes a verem seus pensamentos como eventos transitórios na mente, em vez de verdades literais. Isso pode reduzir o impacto dos pensamentos ansiosos desencadeados por memórias traumáticas. Por exemplo, em vez de pensar "Estou em perigo", a pessoa pode aprender a ver esse pensamento como "Estou tendo o pensamento de que estou em perigo".
3. Valores e Ação Comprometida: A ACT encoraja os pacientes a identificarem seus valores pessoais e a tomarem ações condizentes com esses valores, mesmo na presença de ansiedade. Esse foco no comprometimento através de ações significativas ajuda o paciente a construir uma vida que vale a pena ser vivida, independentemente dos sintomas de ansiedade.
Assim, combinação dos insights da neurociência com as intervenções práticas da ACT oferece um caminho robusto para tratar a ansiedade desencadeada por eventos traumáticos. Compreender as alterações cerebrais e fisiológicas causadas pelo trauma pode fornecer uma base científica sólida para as estratégias de aceitação e comprometimento promovidas pela ACT.
Tudo isso desmistifica ideias que todo mundo que já enfrentou ou enfrenta um transtorno de ansiedade já ouviu pelo menos uma vez "ansiedade é frescura" "basta ter força de vontade para superar a ansiedade", por exemplo.
Para concluir, traumas podem desencadear uma série de respostas ansiosas devido a alterações significativas na estrutura e função cerebral. A neurociência nos ajuda a entender esses mecanismos, enquanto a Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT) oferece estratégias práticas para gerenciar a ansiedade. A aceitação das experiências internas, a desfusão cognitiva e as ações de compromisso alinhadas aos valores pessoais são fundamentais para superar os efeitos debilitantes da ansiedade pós evento traumático. Juntos, esses campos oferecem uma estrutura robusta e poderosa para promover a saúde e o bem-estar mental.
Me conta aqui nos comentários, você sabia de todos esses mecanismos fisiológicos envolvidos num episódio de ansiedade após uma experiência de trauma? E fazia ideia desse tipo de intervenção terapêutica baseada em ciência como uma maneira eficaz para o tratamento?
Se tudo isso é novidade para você, fique por aqui! Será sempre um prazer compartilhar contigo conteúdos dessa natureza.








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